No nosso país, podemos tomar a decisão de fazer um testamento vital desde 2012. Este direito decorre da visão pluralista da sociedade atual que acolhe várias conceções de vida e de morte e reconhece a autodeterminação dos cidadãos nesta matéria, permitindo que cada um, em função dos seus princípios e valores, faça valer a sua vontade no que respeita aos cuidados de saúde que pretende receber ou não, em situações de futura incapacidade.

Esta possibilidade surge ainda num contexto em que se verifica um aumento exponencial das doenças crónicas, crescentes avanços tecnológicos que permitem prolongar a vida e uma postura menos paternalista da medicina que torna as decisões clínicas progressivamente partilhadas com o doente e a sua família.

Atualmente, encontram-se ativos mais de 40 mil testamentos vitais registados no sistema de informação RENTEV, dos quais mais de 14 mil foram outorgados por homens e 26 mil por mulheres, sendo que as faixas etárias com mais registos ativos se situam entre os 65 e os 80 anos e entre os 50 e os 65 anos.

Se procura estar mais informado sobre o que é um Testamento Vital, como se faz e as razões para tomar a decisão de o fazer, continue a ler este artigo.

O que é um testamento vital?

O Testamento Vital consiste num documento através do qual uma pessoa, maior de idade e capaz, manifesta antecipadamente a sua vontade consciente, livre e esclarecida, no que respeita aos cuidados de saúde que deseja receber ou não receber, no caso de se encontrar futuramente incapaz de expressar a sua vontade.

Concretamente, o documento vai elencar as diretivas antecipadas de vontade (DAV), ou seja, as instruções que o seu outorgante pretender tornar vinculativas e que podem consistir, por exemplo, em não ser submetido a tratamento de suporte artificial das funções vitais; não ser submetido a tratamento fútil, inútil ou desproporcionado no quadro clínico e de acordo com as boas práticas profissionais, nomeadamente no que concerne às medidas de suporte básico de vida e às medidas de alimentação e hidratação artificiais que apenas visem retardar o processo natural de morte; não autorizar administração de sangue ou derivados; não ser submetido a tratamentos que se encontrem em fase experimental.

Este documento pode cumulativamente com as DAV, ou em alternativa, contemplar a nomeação de um procurador de cuidados de saúde, isto é, a identificação de uma pessoa da nossa confiança, maior de idade e capaz, familiar ou não, a quem atribuímos poderes para nos representar, no caso de nos encontrarmos incapazes de expressar a nossa vontade no que respeita à nossa saúde, designadamente em contexto de fim de vida.  

Pode-se ainda incluir no texto considerações pessoais ou motivações que ajudem a enquadrar as decisões que tomámos.

A lei portuguesa estabelece limites ao conteúdo das DAV. Não podem ser contrárias à lei, à ordem pública ou determinarem uma atuação contrária às boas práticas; o seu cumprimento não pode provocar deliberadamente a morte não natural e evitável; têm de expressar a vontade do outorgante de um modo claro e inequívoco.  

Acresce que, em caso de urgência ou de perigo imediato para a vida do doente, a equipa responsável pela prestação de cuidados de saúde não terá o dever de considerar as DAV, no caso de o acesso às mesmas poder implicar uma demora que agrave, previsivelmente, os riscos para a sua vida ou saúde.

Como se faz?

Para fazer um Testamento Vital, podemos recorrer ao modelo existente para o efeito, bastando descarregar o documento do portal SNS 24, preenchê-lo e assiná-lo (https://www.spms.min-saude.pt/wp-content/uploads/2016/05/Rentev_form_v0.5.pdf). Em alternativa, e com vista a personalizar o seu conteúdo, é possível fazê-lo num Cartório Notarial.  

O registo do Testamento Vital não é obrigatório, mas é altamente recomendável porque garante que em caso de necessidade, o documento possa ser prontamente consultado pela equipa de profissionais que estiver a prestar cuidados à pessoa que o subscreveu e se encontra incapaz de tomar decisões sobre a sua saúde. Para o efeito, deve ser entregue em mão num dos balcões RENTEV existentes em várias unidades de saúde do país (https://www.spms.min-saude.pt/balcoes-rentev/) e assinado perante o respetivo funcionário, com a apresentação do documento de identificação. Este processo é gratuito. Também é possível enviar o documento por correio registado com aviso de receção com a assinatura reconhecida notarialmente.

O Testamento Vital é revogável a todo o tempo e é válido por um período de 5 anos.  

Razões para fazer um Testamento Vital

  1. Garantir o respeito pelos nossos valores e conceção de vida;
  2. Diminuir a ansiedade e culpa dos familiares quando são chamados a tomar decisões difíceis, sendo que podem não conhecer as nossas preferências e vontades ou não partilharem a nossa visão e os nossos princípios;
  3. Aumentar o conhecimento dos profissionais de saúde relativamente aos cuidados que vamos querer receber e não receber em situação de incapacidade;
  4. Reduzir o uso da chamada “medicina defensiva”, isto é, aquela que visa prolongar a vida até ao limite para que não surjam acusações de negligência;
  5. Diminuir as preocupações legais de todos os intervenientes porque tomámos decisões antecipadamente.

A elaboração de um Testamento Vital deverá pressupor uma reflexão prévia sobre o que significa o processo de morrer e a morte, de acordo com as convicções e perspetivas de cada um, e corresponder a uma tomada de decisão informada sobre os direitos e as escolhas que é possível fazer em fim de vida. Se tiver dúvidas sobre o âmbito e consequências das suas escolhas, solicite esclarecimentos médicos e jurídicos.  

Este artigo é da autoria da Alzheimer Portugal, que se dedica há 36 anos a promover a qualidade de vida das Pessoas com Demência e dos seus familiares e Cuidadores.

Referências

O que falámos neste artigo:
Alzheimer Portugal
Alzheimer
Apoio Domiciliário
Demência